Aspectos emocionais da gestação durante a pandemia de COVID-19

Júlia Vieira Lipert Pazzim

Psicóloga

A gestação é um processo íntimo e singular, que envolve uma série de modificações na vida e rotina da família que aguarda a chegada de um bebê. Desde as primeiras semanas, após a descoberta da gravidez, é possível observar os movimentos interpessoais que ocorrem na dinâmica familiar para a espera do novo integrante. É comum que o bebê se torne o receptáculo do investimento dos pais, fazendo emergir uma série de sensações e sentimentos em torno de sua espera. Obviamente, que nem toda a gestação é esperada, ou até mesmo desejada pelo casal, no entanto, tal fato não se torna um impeditivo para que os pais desenvolvam vínculos afetivos seguros com a criança, na medida em que consigam elaborar e aceitar a sua nova condição.
Neste sentido, podemos pensar na relação que se estabelece entre pais e filhos como um processo complexo e gradual, que pode ser percebido por meio das inúmeras fantasias que são criadas em torno do bebê imaginário. Conforme o pensamento de Lebovici (1987) o bebê imaginário e o bebê real dizem respeito às representações e sentimentos maternos que estão relacionados à criança durante o pré-natal e após o nascimento. Geralmente, as primeiras percepções estão associadas à descoberta do sexo, que é realizada através do exame de ultrassonografia. Além disso, surgem também os primeiros palpites acerca da futura personalidade do recém-nascido, com quem irá se parecer fisicamente e qual o espaço que irá ocupar na dinâmica familiar (Beumord, 2016).
Como bem sabemos, a gestação é também um fenômeno fisiológico, que faz parte de uma experiência de vida saudável e que envolve transformações do ponto de vista social, psicológico e físico. Contudo, diversas situações podem implicar riscos tanto para a mãe quanto para o feto, apresentando maior probabilidade de um desenvolvimento gestacional desfavorável. A partir do avanço da pandemia de SARS-CoV-2 (COVID-19), que demonstrou seus primeiros sinais no Brasil em fevereiro/ março de 2020, o Ministério da Saúde classificou como grupo de risco para o novo coronavírus gestantes, puérperas e mães de recém-nascidos com até 45 dias de vida, uma vez que a gestação muda à resposta do sistema imunológico da mulher, principalmente, quando associada a uma comorbidade.
Estudos recentes têm demonstrado que em países em desenvolvimento, como o Brasil, cerca de 40% da população apresentou sintomas relacionados à tristeza e depressão durante a pandemia de COVID-19 (Barros, Gracie, 2020). Estes dados relacionam-se a diversos estudos que apontaram para prevalência de sintomas depressivos e ansiosos em gestantes durante o mesmo período (Effati-Daryani et al. 2020; Oskovi-Kaplan et al. 2020). Tais resultados evidenciam a importância de ações em saúde mental voltadas para mulheres grávidas e puérperas, uma vez que vivenciam um período mais sensível da vida, mesmo àquelas em que a gestação transcorre no contexto típico.
Assim, torna-se relevante atentar para a necessidade da intervenção psicológica precoce com gestante e puérperas, durante a pandemia de COVID-19, como forma de auxiliar na reorganização psíquica e no desenvolvimento de estratégias que promovam o bem-estar físico e psicológico das futuras mamães.
É importante lembrar, que identificar que as cosias não vão bem, do ponto de vista emocional nem sempre é fácil. A presença de sintomas depressivos com alteração no padrão do sono, tristeza sem razão definida, diminuição do desempenho, sensação de culpa e baixa autoestima, podem indicar um potencial risco na saúde mental materna, requerendo um olhar sensível de uma equipe preparada teórica e tecnicamente para acolher e trabalhar tais conteúdos.
O Serviço Essencial – Cuidado Materno-Infantil conta com uma equipe especializada que disponibiliza atendimento psicológico e fonoaudiológico para gestantes, puérperas e seus recém-nascidos.
Conte conosco!

REFERÊNCIAS

Beaumord, FS. Obstetrícia: Uma clínica para além do nascimento. In: Santos, L.C., Miranda, EMF., Nogueira, EL. Psicologia, saúde e hospital. Belo Horizonte: Ed. Artesã, 2015.
BRASIL. Ministério da Saúde (BR). RECOMENDAÇÃO Nº 039, DE 12 DE MAIO DE 2020.Conselho Nacional de Saúde. 12 de mai. 2020.
Barros, M. Gracie, R. Relato de tristeza/depressão, nervosismo/ansiedade e problemas de sono na população adulta brasileira durante a pandemia de COVID-19. Artigos Originais – Epidemiol. Serv. Saúde 29 (4) 24 Ago 2020.
Effati-Daryani , et al. Depression, stress, anxiety and their predictors in Iranian pregnant women during the outbreak of COVID-19. BMC Psychology (2020) 8:99.
Lebovici, S. (1987). O bebê, a mãe e o psicanalista. Porto Alegre: Artes Médicas.
Oskovi-Kaplan, et al. The Effect of COVID-19 Pandemic and Social Restrictions on Depression Rates and Maternal Attachment in Immediate Postpartum Women: a Preliminary Study. Psychiatric Quarterly, 2020.

 

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